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Writer's pictureAna Possas

A alfabetização de futuros como um caminho possível: conceito e metodologias

Nós já argumentamos sobre os desafios de fazer com que os jovens desenvolvam perspectivas positivas de futuro em um momento de tantas dificuldades como o presente. Para isso, trouxemos algumas pesquisas que confirmam o impacto negativo da pandemia na saúde mental de pessoas com idade entre 15 e 29 anos, contribuindo para um cenário de desilusão e pessimismo.


A desistência, no entanto, não é um caminho. Ao mesmo tempo em que lidamos com dados tão angustiantes, também é possível visualizar uma luz a partir de informações que revelam alguma perspectiva otimista. A pesquisa informal - ou mergulho netnográfico - realizada por João Marcelo Borges e publicada em sua coluna no Nexo Jornal, por exemplo, traz algumas delas.


Em seu texto, Borges conta que há um ano conversa regularmente com 30 jovens com idades entre 16 e 27 anos, a maioria matriculada em instituições públicas de ensino. Apesar de seu artigo ter boa parte focada na desmotivação dos jovens, ele também cita que, de uma lado, existem os “extremamente enérgicos, motivados, que buscam oportunidades de engajamento e participação nos mais diferentes campos: político, cultural, esportivo, comunitário etc.”


Em síntese, o entendimento é de que no grupo dos motivados se encontram aqueles que buscam canalizar suas energias tanto em ações individuais, como práticas esportivas, atividades artísticas e culturais, quanto coletivas, como o engajamento político em pautas nas quais acreditam ou o envolvimento em agendas da própria comunidade em que vivem.


No artigo “Young people hold the key to creating a better future”, publicado pela Fast Company, o fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, explica que os jovens estão sim amadurecendo em um mundo assolado por crises geradas não apenas pela pandemia, mas pelos sistemas socioeconômicos do passado. Sistemas estes que colocaram em risco a subsistência do planeta e corroeram o caminho para vidas saudáveis, felizes e plenas de muitos. Entretanto, Schwab também acredita que os jovens são os mais bem colocados para liderar a transformação de que precisamos.


A convicção do autor advém de sua experiência de 10 anos de trabalho com a Comunidade Global Shapers do Fórum Econômico Mundial. Uma comunidade formada por pessoas com idades entre 20 e 30 anos, mobilizadas para resolver problemas em mais de 450 cidades ao redor do mundo. Ele conta que pôde ver, em primeira mão, que os jovens são os únicos com as ideias mais inovadoras e energia para construir uma sociedade melhor para o amanhã. Em suas palavras:


“No ano passado, os Global Shapers organizaram diálogos sobre as questões mais urgentes enfrentadas pela sociedade, governo e negócios em 146 cidades, atingindo um público de mais de 2 milhões. O resultado desse esforço global de múltiplas partes interessadas, “Davos Labs: Plano de Recuperação Juvenil”, apresenta um lembrete gritante de nossa necessidade urgente de agir e percepções convincentes para criar um mundo mais resiliente, sustentável e inclusivo.”


Tal como Schwab, também acreditamos no poder das juventudes para a construção de uma sociedade e uma economia mais resilientes, inclusivas e sustentáveis. E tal como discorremos no artigo anterior, reafirmamos que quaisquer ações perpassam a educação. Saber da existência de jovens motivados - bem como de seu potencial de multiplicação - é mais um argumento para que sigamos firmes no desenvolvimento de novas práticas de ensino e aprendizagem. Mais precisamente, na alfabetização de futuros. Essa é a missão da plataforma Teach The Future.


Por que ensinar o futuro é importante?


Quando ainda estava no Ensino Médio, uns 20 anos atrás, lembro que eu e minha turma fomos provocados pela nossa professora de filosofia a respeito do significado da frase: “vocês, jovens, são o futuro do país”. Sabíamos o que a sentença queria dizer em essência, mas nunca tivemos uma orientação precisa a respeito de que caminho percorrer para, de fato, criar esse futuro.


Tínhamos esperança de que o futuro seria bom, o que era positivo, mas tínhamos poucas ferramentas práticas que nos ajudassem a compreender as mudanças ou a explorar o nosso papel na formação do futuro. Claro, estamos falando de um contexto do início dos anos 2000, de uma cidade do interior de Minas Gerais com pouco mais de 20 mil habitantes. Por sorte, tínhamos ao menos as reflexões da nossa professora de filosofia.


Hoje, felizmente, a alfabetização de futuros já existe para cumprir esse papel, reforçando a ideia de que jovens de qualquer idade podem aprender a pensar de forma crítica e criativa sobre o futuro e desenvolver estratégias e ações para influenciá-lo. Com base nessa premissa, a comunidade Teach The Future se dedica a levar o pensamento de futuro a escolas, educadores e alunos em todo o mundo. Acreditamos que, ao ensinar o futuro, preparamos os jovens para enfrentar as incertezas e os ajudamos a imaginar e criar o futuro que desejam.


Metodologias: o Future Thinkings Playbook


O currículo Teach The Future (em vários formatos) é ensinado em escolas (ou após o horário escolar) em todo o mundo. Uma das metodologias que utilizamos é a do Futures Thinking Playbook - ou Playbook Pensar Futuros, em português - desenvolvido pelas professoras estadunidenses Katie Bishop King e Julia Rose West. Trata-se de um manual interativo, divertido e envolvente projetado para abrir mentes para muitos futuros possíveis e surpreendentes.


Dividido em 16 peças gerenciáveis, o Futures Thinking Playbook apóia as habilidades de pensamento criativo e crítico dos jovens. Em entrevista a Peter Bishop, fundador e diretor executivo do Teach The Future, a autora Katie King contou que o objetivo era desenvolver algo que um professor pudesse pegar e utilizar com os seus alunos imediatamente, ao mesmo tempo em que pudesse ser algo modular ou utilizado em partes, em sequência ou de acordo com etapas definidas. Em outras palavras, um manual completo em si, mas que também pudesse ser utilizado da maneira como o professor deseja. Tudo isso em quaisquer disciplinas, seja numa aula de redação, de história ou qual for o contexto.


King explica que o livro é dividido em 4 seções que seguem uma ordem específica para pensar sobre o futuro. 1) Pensar sobre o que vai mudar e de que forma podemos explorar o futuro; 2) Fazer pesquisas e pensar sobre tópicos específicos; 3) Imaginar o que o futuro desses tópicos pode ser; 4)Refletir sobre o que sabemos agora que não sabíamos antes.


Uma das atividades introdutórias presentes no playbook consiste em questionar os alunos sobre como eles pensam sobre o futuro. Se pensam que é algo que já está definido ou que é algo bastante indeterminado. Se acreditam que os indivíduos têm muita influência sobre o que acontece no futuro ou não. “Não existe resposta certa ou errada. “O propósito é levá-los a pensar sobre a sua própria perspectiva e, a partir daí, a partir desse pequeno teste de personalidade do futuro, eles recebem um tipo de personalidade”, diz King.


Todo o manual foi desenvolvido para que os jovens fomentem a criatividade e a imaginação, desenvolvam um olhar mais apurado a respeito de mudanças que possam ocorrer no futuro, aprendam diferentes formas de pesquisar e encontrar novas fontes de pesquisa e construam cenários com base em dados. O playbook, em si, foi elaborado com foco nos alunos, mas o livro é acompanhado de um guia que orienta o facilitador sobre como utilizá-lo.


O Futures Thinking Playbook já foi traduzido para vários idiomas e está disponível na Amazon e na biblioteca do site www.teachthefuture.org. Clique aqui para folhear a versão em inglês.


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Artigo escrito por Ana Possas, voluntária do movimento Teach the Future.


Ana Possas é graduada em jornalismo e tem especialização nas áreas de comunicação estratégica e marketing digital. É mestra em cultura e comunicação, com ênfase em análise de tendências, pela Universidade de Lisboa. Acumula mais de 15 anos de experiência nas áreas de educação, cultura e social. Atua como pesquisadora independente e como consultora em comunicação e marketing.

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